domingo, 3 de março de 2013

Parece de amor, mas não é


"E por fim se esqueceram sem dor..."

(Gabriel García Marquez)



Eu não me considero uma escritora porque não tenho nada publicado. No máximo uma pseudo escritora de gaveta. Eu nunca tive uma fórmula mágica para escrever, nunca tive uma hierarquia de organização textual. Tudo sempre foi muito no susto, na hora, dependia sempre da tal da inspiração. A coitada nem deve me aturar, porque eu sou egoísta quando ela é o assunto. Eu sempre a quero pra mim. Não gosto quando ela foge e vai bater perna em outros cantos.

Talvez, não escrever seguindo uma hierarquia textual seja a minha fórmula. Sei lá. Eu não sou aquele tipo de pessoa que escreve o texto inteiro mentalmente antes de publicar, até porque minha memória é limitada. Correção: Minha memória recente é limitada, porque a minha memória antiga está sempre tinindo. Eu me lembro da roupa que eu usei no meu aniversário de 2 anos, lembro de lugares que frequentei aos 4 e lembro de um infinito número de situações da minha infância. Agora, se você me perguntar que roupa usei ontem, não me lembro. Pergunte-me daqui a 10 anos a roupa que usei ontem, talvez eu saiba.

Minha mente também é um pouco preguiçosa quando se trata de papel e caneta. Ela sempre se sai melhor quando está na frente de um computador. Mesmo assim, eu admiro muito todas as pessoas que conseguem escrever maravilhas textuais no papel ou na cabeça, antes de jogar na rede. Toda essa minha divagação sobre o meu modo de escrever deu-se devido a um fato curioso sobre esse texto. Eu comecei esse texto pelo final. É, isso aí. Pelo final. E para lhes adiantar logo, ou melhor, antes tarde do que nunca, lhes digo que esse texto é sobre o fim do amor.

Já ouvi de várias pessoas que quando duas pessoas estão apaixonadas, elas se tornam iguais. É uma permuta de alma. Cada uma cede um pouco. Inevitavelmente, uma das partes sempre vai ceder mais, logo uma das partes se tornará mais parecida com a outra do que a outra com ela. Os dois passam a gostar das mesmas músicas, começam a frequentar os mesmos lugares, alguns amigos acabam ficando no caminho e algumas singularidades também. O amor é quando você se torna a outra pessoa. O fim do amor é quando a outra pessoa muda e torna-se outra. E você continua ali, continua sendo parte do que ela era. E você se perde porque não se encontra mais no outro. 

Quando o amor acaba, não há dor nenhuma. Só existe dor quando uma das partes ainda ama. Esse é o problema. O início do amor é simultâneo, é quase como um nado sincronizado. O relacionamento só começa quando as duas almas envolvidas estão em perfeita sincronia. Mas quando o amor acaba para um dos dois, não existe simultaneidade. É um rompimento de almas, um rompimento que muda a velocidade de cada um, o funcionamento de cada um, e cada um volta a ter o seu próprio tempo. O fim do amor é quando uma das partes solta a mão das mãos que estavam dadas. É o susto, o baque, a solidão, mas só para a parte que ficou com a mão estendida. O fim do amor é como tentar ressuscitar alguém que assinou um termo de "não-ressuscitar". Lutar sozinho por um amor não é amor. É o fim. 

O amor só chega ao seu legítimo final quando a outra pessoa também descobre isso. E descobre que não há mais volta, ou milagre, ou oração, muito menos tempo. E quando você descobre que o tempo é só uma desculpa que a gente dá quando ainda ama. O tempo não cura nada, não reata nada, não costura. O tempo apenas passa e reza para que você aprenda alguma coisa enquanto ele passa. Antes que ele passe de vez. 

O fim do amor não tem poesia, não tem choro nem plateia. O fim do amor não tem trilha sonora. O fim do amor é quando você joga a trilha sonora daquilo que um dia foi amor no lixo. Não por raiva, mas por espaço. O fim do amor é quando você pega toda essa trilha sonora e joga fora porque você precisa de espaço para as músicas novas . O fim do amor é silencioso e calmo. Não faz barulho, não dói, não vira texto. E é por isso que esse texto está sendo escrito sem música. Porque não é mais amor. E esse texto só está sendo escrito porque alguém precisava te contar isso. Esse texto não é poesia, é informação. É silêncio. O fim do amor é o esquecimento. 

11 comentários:

  1. Devo dizer que considero o fim do amor muito mais bonito do que seu começo, pois é como diz em Anna Karênina: "todas as famílias felizes são iguais, mas cada família infeliz é infeliz à sua maneira". Os amores começam da mesma forma, juras são trocadas, palavras - um tanto quanto vazias e clichês até - e gestos sendo repetidos sincronicamente. Mas o fim é sempre ímpar.
    Eu gosto de ímpares.
    E gosto de fins.

    Também sou como você em matéria de memória: minhas lembranças são ótimas para coisas há muito passadas, mas para coisas recentes... vixe! Aí complica.

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  2. É por isso que você às vezes demora a escrever, porque quando o faz, se supera. Sempre.

    Não gosto de fins, e na verdade acho que nenhum amor (de verdade) acaba, apenas se transforma em uma forma diferente de amar...

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  3. Marie, que lindo seu texto! Lindo e muito sensível, mas discordo um pouquinho dele. Não acho que amor seja uma pessoa se tornar outra, acho que tem mais a ver com duas almas vibrando numa mesma frequência, ou melhor, numa frequência que tenha um ritmo próprio. Tipo uma valsa, sabe? Mas não igual. Porque igual é chato demais, e Deus me livre casar com um Anna Vitório por aí.

    Sobre o fim, tem essa crônica que eu gosto muito e tem bastante a ver com o que você escreveu. Espero que goste =)
    http://www.releituras.com/i_eleonora_pmcampos.asp

    beijos

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  4. Realmente, achei teu texto ótimo. Aquele ótimo da categoria dos incríveis, assim. Altas reflexões e uns sentidos que fazem sentidos, entendeu? hehe Achei que tu abordou diferente, que mostrou mais o teu estilo e o teu jeito, gostei bastante mesmo. Beijão Gê, adorei.

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  5. Bom, devo me levantar da cadeira e te aplaudir ou permanecer sentada chorando mesmo?
    Texto ótimo como sempre, não vou comentar o que estou ouvindo.
    Você é sim uma escritora, que ainda não publicou nada como eu mas é.
    E quanto a sua definição para o fim do amor, UAU! Queria ser assim, madura pra essas coisas, porque pra mim todo fim dói e muito sabe, tem trilha sonora, tem tudo.
    Mas eu gostei muito de ler como você leva as coisas e como a sua memória é boa, a minha é uma merda, só lembro do que não devo mesmo.
    Desculpe o comentário meio sei lá, confuso, não estou nos melhores dias.

    Ps: Ate que enfim publiquei o texto que escrevi inspirado no seu.


    Beijos

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  6. De tudo isso aí eu só não concordo que o início do amor é simultâneo. Às vezes começa antes em um, e este fica um tempo com a mão estendida até que o outro resolva (ou não) pegar.. Duro é quando já termina "caçando" um final...
    Lindo texto, Marie!
    Te amo!

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  7. E é isso ai, praticamente uma união de almas (as vezes realmente isso), até que alguém precise daquele espaço para as novas canções, o que só dói pra quem sobra. "Sobra" até perceber que tudo precisa de um ritmo novo e que isso é inevitável. Parabéns pelo texto (:
    Eu, por exemplo, acredito que minha ideias ficam bem melhores quando escolho começar com o papel e a caneta, legal saber de opiniões diferentes! hahah
    Um beijo

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  8. Este comentário foi removido pelo autor.

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  9. Fala feia!!!Blz?
    É claro que eu tinha que comentar!!!!

    Sinceramente, pensei que ia encontrar outro conteúdo por aqui, mas gostei do que vi, ou melhor, do que li.
    Acho que você fez uma reflexão linda dos seus pensamentos e quando digo "seus pensamentos" me refiro ao seu momento ou aos momentos que te motivaram a escrever tudo isso, entende? É algo que a gente deve ler não pra concordar ou pra discordar, mas algo que está ai... que fica ai, pra gente imaginar...

    Bixa feia, continua escrevendo... e ahhhh por favor, me faça um texto engraçado!!!!Daqueles bem cômicos... Adoraria ver um desses feitos por você e sei que a sua pessoa tem total bagagem pra isso!!!!(tipo Bridget jones saca?)

    Fica bem Patinete... continua escrevendo e vivendo e criando...
    Simbora gerundiá que vale a pena!!!!!

    Bjo da sua amiga e futura sócia!!!!

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  10. As últimas linhas foram cruéis e seria errado não ser.
    Dizem que o amor de verdade não acaba nunca, o que desmerece totalmente a nossa crença de um dia ter amado e aquilo ter se acabado diante dos nossos olhos.
    E quem sabe, noutro dia, não é a nossa vez de, mesmo com olhos chorosos, ter que partir.
    Uma pessoa mal consegue ser si mesma, por isso é tão difícil duas se tornarem uma.
    Mas a gente sobrevive.

    E a respeito da escrita, não creio que uma editora faça a natureza de seu ninguém.
    Sendo assim, você já é uma escritora.

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  11. "O fim do amor é quando você pega toda essa trilha sonora e joga fora porque você precisa de espaço para as músicas novas . O fim do amor é silencioso e calmo. Não faz barulho, não dói, não vira texto." Oi? Esta sou eu! Você simplesmente me definiu... acho que foi exatamente isso que aconteceu comigo e eu andava me cobrando coisas como: então você nunca amou o cara? e você não deveria estar sofrendo ao ouvir essa música? eu ando surpresa comigo e não entendia bem o porque...
    Acho que é isso. O amor acabou. Ponto.

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